quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Efemérides da História Lusófona: #3 A independência de Angola (11 de novembro de 1975)


     No dia 11 de novembro de 1975, Angola proclama a sua independência. Se este dia marca o nascimento de um novo país, ao mesmo tempo que o encontro de uma nação com um Estado ainda por criar, assinala também o término da presença portuguesa. Em 1485, Diogo Cao alcançara as margens do rio Congo onde deixara a marca da sua passagem (ver Pedra de Ielala). Cerca de cinco séculos depois chega ao fim uma história comum, cheia de sofrimento, dramas, injustiças mas também de cooperação, enriquecimento mútuo, interculturalidade e de humanidade.

Brasão da Província Ultramarina de Angola

     É António Agostinho Neto, médico, escritor e líder do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), quem proclama solenemente a independência do país.
Agostinho Neto: «o MPLA proclama solenemente perante a África e o Mundo, a independência de Angola», 11/11/1975

Discurso de proclamação da independência
     No contexto do movimento de libertação de Angola, os escritores, e em particular os poetas, tiveram um papel muito importante na luta contra o colonizador português; vozes que denunciaram a condição do povo negro, a descriminação de que era alvo e todo o seu sofrimento.
     Deixemos a palavra aos poetas deste nosso povo irmão:

ADEUS À HORA DA LARGADA (1951) António Agostinho Neto
Minha mãe
(todas as mãe negras
cujos filhos partiram)
tu me ensinaste a esperar
como esperaste nas horas difíceis

Mas a vida
matou em mim essa mística esperança

Eu já não espero
sou aquele por quem se espera

Sou eu minha Mãe
a esperança somos nós
os teus filhos
partidos para uma fé que alimenta a vida

Hoje
somos as crianças nuas das sanzalas do mato
os garotos sem escola a jogar a bola de trapos
nos areias ao meio-dia
somos nós mesmos
os contratados a queimar vidas nos cafezais
os homens negros ignorantes
que devem respeitar o homem branco
e temer o rico
somos os teus filhos
dos bairros de pretos
além aonde não chega a luz elétrica
os homens bêbedos a cair
abandonados ao ritmo dum batuque de morte
teus filhos
com fome
com sede
com vergonha de te chamarmos Mãe
com medo de atravessar as ruas
com medo dos homens Bandeira de Angola
nós mesmos

Amanhã
entoaremos hinos à liberdade
quando comemorarmos
a data da abolição desta escravatura

Nós vamos em busca de luz
os teus filhos Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
Vão em busca de vida.

CONSCIENCIALIZAÇÃO (1951) António Agostinho Neto
Medo no ar!

Em cada esquina
sentinelas vigilantes incendeiam olhares
em cada casa
se substituem apressadamente os fechos velhos
das portas
e em cada consciência
fervilha o temor de se ouvir a si mesma

A História está a ser contada
de novo

Medo no ar!

Acontece que eu
homem humilde
ainda mais humilde na pele negra
me regresso Àfrica
para mim
com os olhos secos.

PRELÚDIO (1951) ALDA LARA

(para a Lydia – minha velha ama negra)

Pela estrada desce a noite
Mãe-Negra, desce com ela...

Nem buganvílias vermelhas,
nem vestidinhos de folhos,
nem brincadeiras de guisos,
nas suas mãos apertadas.
Só duas lágrimas grossas,
em duas faces cansadas.

Mãe-Negra tem voz de vento,
voz de silêncio batendo
nas folhas do cajueiro...

Tem voz de noite, descendo,
de mansinho, pela estrada...

Que é feito desses meninos
que gostava de embalar?...

Que é feito desses meninos
que ela ajudou a criar?...
Quem ouve agora as histórias
que costumava contar?...

Mãe-Negra não sabe nada...
Mas ai de quem sabe tudo,
como eu sei tudo
Mãe-Negra!...

Os teus meninos cresceram,
e esqueceram as histórias
que costumavas contar...

Muitos partiram p'ra longe,
quem sabe se hão-de voltar!...

Só tu ficaste esperando,
mãos cruzadas no regaço,
bem quieta bem calada.

É a tua a voz deste vento,
desta saudade descendo,
de mansinho pela estrada…



O RITMO DO TANTÃ (1970) António Jacinto
O ritmo do tantã não o tenho no sangue
nem na pele
nem na pele
tenho o ritmo do tantã no coração
no coração
no coração
o ritmo do tantã não tenho no sangue
nem na pele
nem na pele
tenho o ritmo do tantã sobretudo
mais do que pensa
mais do que pensa
Penso África, sinto África, digo África
Odeio em África
Amo em África
Estou em África
Eu também sou África
tenho o ritmo do tantã sobretudo
no que pensa
no que pensa
penso África, sinto África, digo África
E emudeço
dentro de ti, para ti África
dentro de ti, para ti África
África
           África
                       África.

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